Desde 2013, a jornada dos filmes da DC tem sido marcada por altos e baixos. Resultados irregulares nas bilheterias e as opiniões mistas e polêmicas entre os fãs e a crítica geraram indefinições no rumo desse universo que pudessem gerar uma narrativa coesa similar a que foi estabelecida por anos pela co-irmã Marvel.
E se já estava difícil manter uma linha narrativa coesa em todo esse universo, um personagem em especial acabou sofrendo bastante em meio a tudo isso, e dessa vez eu não me refiro ao Superman de Henry Cavill, mas sim ao Flash de Ezra Miller, que passou pela mão de diversos diretores e roteiristas para ganhar uma história nas telonas (clique aqui e saiba mais).
Demorou, mas finalmente o Velocista Escarlate ganhou sua aventura nos cinemas, e seu filme carregava consigo o peso e a responsabilidade de fechar o ciclo desse universo conturbado e abrir espaço para novidades que poderiam dar novas esperanças aos fãs do Universo DC.
Neste contexto, essa crítica carrega um duplo desafio: avaliar a qualidade da obra em si, ao mesmo tempo em que analisa seu papel na trajetória da DC nos cinemas. E já posso adiantar que esse é um trabalho muito difícil.
Acontece que o filme solo do Flash não cumpre nada do que vinha prometendo em sua divulgação, e eu não me refiro ao discurso mentiroso desse ser “o melhor filmes de heróis desde O Cavaleiro das Trevas de Christopher Nolan”, mas sim da ideia de quem esse filme iria fechar e abrir ciclos para os Mundos da DC.
Quando a história começa, voltamos a acompanhar alguns dos personagens já estabelecidos naquele universo em uma boa aventura em equipe. Essa apresentação na perspectiva do protagonista nos dá a entender que o filme carregará consigo uma vibe mais divertida (podendo beirar a galhofa) desse universo que foi se libertando aos poucos de uma assinatura terrivelmente sombria.
Mas logo após a sequência inicial, o filme entra numa espiral confusa durante todo o primeiro ato por não se decidir em como equilibrar seu humor e seu drama. Existem momentos onde a inserção da seriedade do personagem que não casa pelo fato do mesmo estar fazendo algo que não encaixa com esses momentos segundos antes, e ao retornar ao humor o filme exagera até demais na dose, fazendo com que os momentos que poderiam ser divertidos pelo bizarro previamente estabelecidos ficassem apenas constrangedores.
Essa indefinição no tom também prejudica na relação dos personagens ao decorrer da narrativa.
Existem boas relações estabelecidas entre a Liga da Justiça e até com a família de Barry pelo fato de já estarmos acostumados com esses personagens interagindo ao menos uma vez, mas essas mesmas relações não funcionam nos novos personagens da trama — me refiro aos amigos de Barry vividos por Saoirse-Monica Jackson e Rudy Mancuso e a presença de Iris West (Kiersey Clemons).
O roteiro e a direção tentam forçar uma relação entre esses personagens que de nada colabora com a trama e tudo o que eu esperava era que o filme voltasse a ignorá-los.
O filme parece finalmente se encontrar durante o segundo ato. Aqui existem bons momentos dramáticos que geram certa empatia, mas é na comédia que a história ganha força, quando temos a interação entre as duas versões do Barry Allen de Miller.
O roteiro de Christina Hodson consegue finalmente trazer boas relações entre os personagens ao direcionar a trama para algum lugar e gerar alguns dos momentos mais divertidos da trama. Criei esperanças que agora a história iria finalmente se encaminhar para algo melhor, mas ela infelizmente se enrola novamente pela necessidade de inserir o Batman de Michael Keaton e a Supergirl de Sasha Calle na trama.
A começar pela participação de Keaton, apesar de ser legal ver o ator de volta ao papel, senti que sua presença foi apenas um desejo da equipe de produção em justificar o Multiverso através da nostalgia do público — como em ouvir a trilha sonora clássica do personagem junto às novas e interessantes faixas do filme.
Existe um momento isolado da trama onde vemos o Bruce de Keaton interagindo com uma das versões de Barry para resumir sua jornada e suas ações ao longo dos 30 anos que não o vimos, e aqui vemos o potencial que o personagem poderia ter na história desse filme ou até mesmo do futuro do DCU como era desejo dos produtores, mas tudo isso foi logo descartado e sua presença não tem mais peso algum no decorrer da trama.
Já a presença da personagem de Calle mostra que atriz entrega o básico que lhe foi oferecido ela pelo roteiro e a direção, mas seu trabalho se difere da forma que utilizaram a personagem, que foi inserida abruptamente na história não conseguiu estabelecer suas motivações que pareciam interessantes se tivesse mais tempo de serem contadas. Contudo, está versão da Supergirl existe apenas para justificar a presença do General Zod de Michael Shannon, outra participação que, assim como Keaton, se faz presente apenas pela tentativa de gerar algum apelo nostálgico a esse universo, pois, no final das contas, a participação desses dois super personagens (Zod e Kara) nem fedem e nem cheiram para o restante da trama — mas servem para mostrar um furo de roteiro da equipe de produção por não se importar com regras estabelecidas pelo universo dos filmes quanto ao uso dos poderes dos Kryptonianos.
E ainda falando sobre essas participações, queria abrir um destaque maior para os cameos que o filme trouxe.
O filme do Flash não depende de maneira alguma de suas referências, mas admito que fiquei extremamente incomodado quando o filme para sua história e DO MAIS ABSOLUTO NADA traz essas participações disfarçadas de homenagem ao Multiverso DC. Participações essas que considero proibitivas até demais, pois muitas delas exigem que o público geral conheça toda a história do cinema e dos bastidores dos filmes da DC, pois sem isso elas não passarão de meros acréscimos que em minutos serão esquecíveis por todos, podendo ter usado desse tempo inútil deles para contar uma história melhor, ou até mesmo justificar atitudes dos antagonistas e corrigir o confuso ato final.
E falando em inserções aleatórias, preciso comentar sobre o elefante na sala do filme: OS EFEITOS VISUAIS.
Eu tento não me importar com a inserção dos efeitos visuais de um filme para focar na narrativa proposta por ele, mas numa história com um grande orçamento como a de Flash exigir um refinamento nesse quesito, posso admitir que existem bons momentos onde os efeitos são bem utilizados por escolha da direção, mas que são terríveis em momentos que também foram decididos pela direção de Andy Muschietti e do time de produtores.
E apesar dos esforços do diretor em justificar o uso dos efeitos em algumas das cenas, elas não salvam os momentos chaves que falham miseravelmente em trazer algo que nem mesmo a galhofa justificaria. (FIM DO MOMENTO SOMMELIER DE CGI).
Com o perdão do trocadilho, mas The Flash corre para fechar toda a bagunça que criou ao longo da história com as justificativas mais fracas possíveis para encerrar o grande perigo da narrativa. E é apenas em UM momento quando está solucionando uma trama íntima para o personagem que o filme relembra de que pode acertar (e acerta) em solucionar um mistério importante para a vida do personagem.
E com esse respiro de que eles poderiam finalmente acertar no desfecho da narrativa e ter um saldo mais positivo, o filme encerra com um gancho mais uma vez proibitivo e que não justifica sua premissa de encerrar ciclos.
The Flash foi o último suspiro do que foi o DCEU iniciado em 2013, trazendo consigo todos os erros terríveis e gritantes que esse universo tinha nos cinemas, mas se esforçando para trazer elementos que trazem algo positivo para a história. É uma pena que esses momentos são vistos pouquíssimas vezes e de forma isolada, pois se eles decidissem focar nesses núcleos ao invés de forçar algo épico para narrativa, talvez tivéssemos uma história muito melhor amarrada sendo contada.
O Universo DC estabelecido ao longo desse anos não nos deu tempo suficiente para nos acostumarmos com a presença dos personagens vistos aqui, o que faz com que a despedida forçada pelas consequências do filme não tenha significado algum em toda narrativa. O filme ainda busca deixar um final aberto na tentativa de convencer os produtores de que vale a pena investir naqueles personagens bem parecido com o que Dwayne Johnson fez ao inserir o Superman de Cavill em Adão Negro, mas torço para que o novo universo DC nas mãos de Peter Safran e James Gunn decida ir por um caminho totalmente novo e livre das amarras dos personagens ruins e mal aproveitados nesses últimos anos.
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