Um elenco estelar. Uma trama sobre a indústria musical, com pegada de thriller erótico dos anos 90. Um estúdio cultuado (A24), notado pela ousadia de suas produções. Uma emissora (HBO) com um alto padrão de qualidade. O que poderia dar errado? Infelizmente, meus queridos, tudo. Nos venderam entretenimento e recebemos uma bomba de proporções nucleares.
Para os fofoqueiros de plantão, faço questão de uma volta no tempo. A série, focada na relação conturbada entre uma pop star e um líder de seita, tinha uma ótica feminina. Em se tratando de uma protagonista, nada mais interessante do que uma mulher nos papéis de roteirista e diretora, certo? Infelizmente, às vésperas da conclusão das filmagens, Abel (The Weeknd) e Sam Levinson (Euphoria) tomaram as rédeas do trabalho. Enquanto o cantor de indignava com o viés feminista da história e com seu personagem “ofuscado”, Sam tomou a direção para si. As gravações recomeçaram, para o desespero de toda a equipe.
O resultado não poderia ser pior: um prejuízo milionário para a emissora. Para se ter uma ideia, Abel acabou cedendo a própria casa como locação, num tentativa desesperada de corte de gastos. No entanto, as polêmicas só cresceram: o clima era caótico nos bastidores, com direito a roteiros alterados em cima da hora. Personagens outrora participantes, agora ofuscados. Estrelas como Rachel Sennott, Troye Sivan e Jennie (BLACKPINK) escaladas de última hora, sujeitando-as a meros coadjuvantes e figurantes de luxo.
Talvez, com um pouco mais de sorte, The Idol tivesse conquistado uma pequena parcela do público, mas trata-se de uma série que nasceu morta. Desde abril, quando uma reportagem da The Rolling Stones expôs as polêmicas da produção, o público torceu os olhos. Quando os dois primeiros episódios foram exibidos no Festival de Cannes e rechaçados pela crítica, via-se que o fracasso era evidente. A opinião pública já fora criada.
Mas trata-se de mera influência midiática? Não, The Idol é mesmo ruim. Às vezes instiga e seduz, mas apenas para te lembrar no minuto seguinte que tudo não passa de uma porcaria. O excesso de nudez feminina e BDSM é incômodo, dado o quão gratuito soa. É perceptível o prazer de Sam Levinson e Abel enquanto exploram o corpo feminino a todo instante. Devido a isso, o roteiro perde tanto de tela com sexo quando o ouro, na verdade, sempre foi a protagonista no núcleo da indústria musical. Afinal, o plot da seita nunca disse a que veio. Na melhor das hipóteses: de que adiantaria The Weeknd ter dotes de atuação, se o personagem é mais raso do que piscina infantil?
Lilly-Rose, por um lado, tirou ouro da personagem! A filha de Johnny Depp convence como a pop star quebrada e solitária, explorada até o último fio de cabelo pela gravadora sanguessuga. Destaque, ainda, para a INCRÍVEL sequência da gravação de clipe no 2º episódio. As camadas da personagem estão todas ali, contraditórias como deveriam ser. Os produtores e gerentes, desprovidos de caráter e apodrecidos, mas sempre interessantes em cena. No entanto, logo tudo é ofuscado. A narrativa é quebrada por buracos a todo instante, deixando lacunas para que o espectador preencha. Então, a grande questão da trama permanece: quem era Jocelyn, a protagonista? Após o último episódio, vejo que nunca saberemos, pois a personagem simplesmente não aconteceu.
O restante do elenco até tira leite de pedra, mas o texto não é inspirado. Os diálogos, por mais afiados que sejam, beiram o ridículo, com ares de conversa de bar entre dois machões de meia idade. A fotografia até aposta em ângulos interessantes e significativos, mas a direção peca ao prolongar cenas vazias e silenciosas sem necessidade. Quanto à trilha sonora, dou o braço a torcer: é chiclete, pegajosa e já compõe minha playlist no Spotify. A montagem alterna entre o aceitável e uma verdadeira bagunça, com trinta falas pipocando em cena ao mesmo tempo - algo que a falecida e eterna Succession fazia com primor.
Talvez se The Idol tivesse sido lançada nos anos 2000, tivesse sido mais abraçada pelo público. Nos dias de hoje, suspenses sobre homens violentos, sexo explícito e mulheres fatais que fingem histeria simplesmente não funcionam mais. Subestimar a inteligência do público é o pior erro que se pode cometer, e espero com todo meu coração que paguem caro por essa atrocidade. Que a HBO aposte em novos diretores, e que Abel nunca mais ponha as mãos num roteiro.